about
Excertos de conto tradicional de Skyros (Grécia) e de poemas de Rilke, Fernando Pessoa, Daniel Faria, Drummond de Andrade e Nuno Júdice.
lyrics
Era uma vez um velho pastor que pastava, com a sua mulher, um grande rebanho, na planície do outro lado da ilha.
Foi um tempo branco
Mais doloroso do que os olhos sempre abertos no escuro
Estava tudo pronto para a chegada da Primavera quando, inesperadamente, começou a nevar durante a noite.
Nevou durante dois dias. As ovelhas berravam em desespero.
Um tempo branco muito diferente da verdade.
Quando o casal conseguiu, finalmente, sair do abrigo para procurar as ovelhas… só encontrou cadáveres.
Muito diferente das estrelas que se apagam.
Enlouquecidos, recolheram os badalos, enrolaram-nos em cordas à volta da cintura e desceram ao povoado para contar a desgraça.
Foi um tempo branco porque era mudo.
Mas quando chegaram à vila não conseguiram explicar o que lhes aconteceu, as palavras não lhes saíam, a voz entaramelava-se na garganta.
Em desespero gesticulavam, exprimindo a sua dor e tentando explicar o sucedido… mas no povoado ninguém os compreendeu, deram-lhes de beber e acompanharam-nos numa dança grotesca.
Um tempo tão manso como um lobo que não morde.
Estonteados de cansaço, os pastores caíram exaustos no chão.
Só dias mais tarde iriam os camponeses dar pelo desastre!
Foi nos dias em que vieram as montanhas
Foi nos dias em que vieram as montanhas
Os velhos pais labutavam nos campos
Quebravam as pedras
arrancavam a erva selvagem
Foi nos dias
Foi nos dias
Foi nos dias
em que vieram as montanhas
Trabalhosos dias.
A tua lenha é só peso que levas.
E os olhos não choram
É uma grande tarefa
E as mãos tecem
Um trabalho sem fim
Um trabalho…
sonâmbulo
Pesados são os montes
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Pesados são os mares
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
credits
from
Do outro lado do monte,
released November 28, 2019
Voz: Helena Patrício
Conto:
Tradicional de Skyros (in "Escrever os meses a seguir os dias - Março", de Ana Paula Guimarães)
Poemas:
Rainer Maria Rilke (1875-1926)– “Os czares"
Fernando Pessoa (1888-1935) - "Pouco usamos do pouco que mal temos"
Daniel Faria (1971-1999) - Excertos de "Mas basta-me um quadrado de sossego"
Drummond de Andrade (1902-1987) - Excertos de "Os ombros suportam o mundo"
Nuno Júdice (1949- ) - Excertos de "Um poema de amor, ainda"
Instrumental:
A hora escura (gentilmente cedida por Sangre de Muerdago)
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